A primeira vez que viajei sozinha não foi bem uma viagem completa. Eu tinha exatamente uma semana de folga no fim do ano, na semana do réveillon, e meus amigos tinham mais tempo para viajar. Então combinamos de ir para Buenos Aires e ficar até domingo, quando eu voltaria para São Paulo e eles iriam para o Uruguai. Mas eles queriam chegar só na terça à noite, por causa do horário do voo. E eu não queria deixar de aproveitar minha folga por inteiro. Então, embarquei pela primeira vez sozinha na segunda-feira logo cedo. Seriam pouco mais de 36 horas sem companhia de amigos, em um país no qual nunca tinha estado. E aí, logo que confirmei que faria isso, já surgiu gente com a dúvida: você não vai se sentir sozinha?

Rachel sentada em mureta ao lado de parede grafitada com a cidade de Tallin ao fundo.
36 horas, 24 dias, 7 dias, 27 dias: essas são as durações das minhas viagens sozinha até agora. Ah, e um intercâmbio também…

Já vou adiantar que não, não me senti sozinha. Nem tudo foi confortável nessa primeira viagem solo (ou nas outras que fiz sozinha desde então), mas uma coisa é certa: momentos reais de solidão foram raros. E tem um motivo para isso: não é difícil viajante encontrar companhia no hostel ou durante os passeios. Aliás, eu já falei que um dos mitos sobre viajar sozinho é que você precisa ser super extrovertido, daqueles que puxa papo fácil com desconhecidos e está sempre tranquilo. Maior mentira que existe. O que você precisa para viajar sozinho ou sozinha é querer. E aceitar a própria companhia, porque essa é inevitável em qualquer viagem, já diria o filósofo Allan de Botton.

Amizades de 15 minutos

Agora que você já está se preparando para “viajar sem outras companhias”, eu quero falar sobre esse fenômeno que é fazer amizades aleatórias em viagens. “Amizade de 15 minutos” foi o nome que eu dei na época do meu intercâmbio na Disney para descrever o relacionamento com pessoas que me contavam a vida logo depois de me conhecerem no ônibus a caminho do trabalho. E, depois de 15 minutos, nossos caminhos se separavam e a gente nunca mais se via. Acho que o “estar fora do país de origem” faz com viajantes já tenham automaticamente algo em comum. Seria isso o motivo dessa amizade acelerada? Se alguém pesquisador ou curioso tiver alguma informação sobre isso, por favor, conta pra gente aqui nos comentários! A verdade é que sempre foi muito fácil encontrar a companhia de outro viajante sempre que peguei a estrada.

Naquela primeira viagem (de 36 horas), eu caminhei muito sozinha. Sentei em cafés sozinha (algo que eu já fazia no meu dia a dia, então foi um elemento a menos com o qual me acostumar). Estressei-me no metrô e puxando a mala no calçadão da Calle Florida, no centro de Buenos Aires. E para ir do hostel mais arrumadinho onde estava sozinha ao hostel mais jovem (só em público, não em estrutura) em Palermo, onde eu iria encontrar meus amigos brasileiros. Pouco depois, um alemão chegou para conversar com o australiano que estava no mesmo quarto que eu e, quando vi, novas amizades. Eles estavam me convidando pra ir jantar com uma galera do hostel e deixando o endereço do restaurante para eu ir depois com meus amigos. E eu me perguntando: como foi que isso aconteceu?

Era minha primeira estadia em hostel. Hoje em dia, eu sei que isso é muito comum. Em quase todos os hostels onde eu me hospedei, surgiu algum papo aleatório que eu não sei bem dizer como começou, mas que equilibrou meus passeios sozinha com risadas aleatórias e verdadeiras.

Rachel sentada em banco de praça com chão de cascalho e árvores ao fundo.
Sete anos depois do meu primeiro rolê sozinha em Buenos Aires, achei a praça onde eu parei durante minhas caminhadas que deram origem à “Rachel que viaja sozinha”.

Mulheres viajantes

Eu demorei um pouco para chegar a esse tema, mas o que quero dizer é: fico muito feliz de ver cada vez mais mulheres viajando sozinhas. E nós somos excelentes amigas de 15 minutos. Sou muito grata por todas as viajantes que conheci, que me fizeram companhia nas baladas, em almoços, e até mesmo em trajetos do transporte público. História real. Uma irlandesa me viu consultando o mapa do river bus de Londres e me ofereceu ajuda, dicas de restaurantes, e de passeios. Quinze minutos depois, ela me adicionou no facebook, “para ter algum conhecido na cidade se precisasse de algo”. Mesma coisa que fez uma norueguesa a caminho de um show na Suécia (também viajando sozinha) ao começarmos a conversar no trem.

Rachel em vagão vazio do metrô de Londres.
Sozinha, inclusive, no metrô de Londres.

Sou grata à canadense que derrubou a salada dela em mim na área comum do hostel de Londres. Ela me contou que estava de mudança para a Inglaterra e eu disse que ainda não tinha conseguido ir a um pub. Logo depois, ela já tinha chamado uma outra conhecida dela no hostel e nós fomos curtir uma música ao vivo em um bar muito legal. Ainda devo uma rodada de cerveja para as duas. E devo a elas também ter aprendido que gosto mais de pear cider do que de cerveja.

E também às duas canadenses que conheci em Dublin num pub crawl e que me chamaram para comer batata-frita com elas antes de voltar pro hostel, para eu não ter que caminhar sozinha. Teve também uma garota – não lembro de qual país – que conheci em Estocolmo que colocou em palavras a sensação que eu sempre tive nessas amizades aleatórias de viagem. Enquanto a gente caminhava em direção ao pub crawl, ela juntou as meninas do hostel e disse: “Em casa, todo mundo tem os amigos que não te deixam para trás, nem te deixam sozinha. Por hoje, nós somos essas amigas umas das outras.”

E você, já fez alguma amizade temporária em viagem?

Com toda a certeza, esse não é um fenômeno raro. Afinal, mesmo com poucas viagens sozinha (quatro ao todo, embora duas tenham sido bem longas), eu consigo ter várias histórias de pessoas legais dispostas a não me deixarem ser uma turista perdida. Então, cara viajona (ou caro viajão também), se um dos motivos para você ainda não ter encarado uma viagem solo até agora for o receio de se sentir só, lembre-se, em primeiro lugar, da sua própria companhia. Dos livros que você pode ler sentada no parque. Dos passeios que você pode fazer no seu próprio ritmo. Depois, que tem muita gente viajando sozinho por aí, só esperando para fazer amizades reais. Ainda que seja para durar só o tempo de um trajeto de ônibus. =)